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sábado, 31 de março de 2007

De Frescuribus non Proliferandus Est (ou Deveriabus Ser) III

Se você não leu a segunda parte, clique aqui. Se não leu também a primeira parte, clique aqui.

Estimados clientes,

Os restaurantes têm uma medida para as taças de vinho. A menos que você perceba que há uma variação na quantidade, por favor entenda que o preço cobrado é pela quantidade de vinho calculada, e isto não quer dizer uma taça de vinho menos um centímetro, não importa que tamanho a taça tenha.
Mas, na verdade, este tópico se refere aos malfadados tamanhos das taças. Pra variar, não há regras para isso:

Lição 5: O tamanho da taça é diretamente proporcional à probabilidade do cliente reclamar sobre a quantidade de vinho.

Estou parecendo uma professora do primário, mas vamos lá:

O copo de água pode ser de qualquer tamanho, cor, formato, nacionalidade; basta que ele agrade aos proprietários da casa, seja ela um restaurante ou um lar.

A taça de vinho, branco ou tinto, deve ser antes de tudo confortável. Algo muito pequeno não só não comporta uma boa quantidade de bebida, como impede a nós, apreciadores, de perceber os aromas do vinho em toda a sua plenitude.

É importante que reste algum espaço entre a boca da taça e a superfície do vinho e é também por isso que não se deve encher demais uma taça. Eu diria que não mais que um terço, mas na prática nunca mais que dois deles.
É neste espaço onde o ar do ambiente irá permanecer em contato com o líquido, desencadeando uma série de reações e é também onde a nuvem de aromas irá permanecer, semi-enclausurada, esperando nossos narigões.

Existem taças projetadas específicamente para diferentes tipos de vinhos. Estas taças custam cerca de R$100,oo (unidade, não peça-pedaço-quilo) e são de um objetivo que ultrapassa as agradáveis noitadas dos meros mortais.


Bem, acho que é isso. Penso que seja MUITO muito importante ressaltar que estas são as minhas conclusões sobre estes assuntos, e não regras que gostaria de determinar. Como ex-garçon e sempre-cliente, estive dos dois lados da taça e sei que não é fácil pra nenhum dos lados. Se qualquer um de vocês tiver uma opinião, história ou certeza sobre qualquer coisa, por favor compartilhe conosco.

sexta-feira, 30 de março de 2007

De Frescuribus non Proliferandus Est (ou Deveriabus Ser) II

Se você não leu a primeira parte, clique aqui.

Lição Três: Sobre como eu, que estou pagando e não gostei do vinho, mando devolver a garrafa, que está ruim.

Pois é, meus amigos. Eu gostaria de ter um "dinheiros" (D$, moeda corrente no mundo da imaginação dos clientes de restaurantes) para cada garrafa bouchonée que foi tomada como se fosse um Grand Cru Classé de alguns milhares de dólares, enquanto inúmeras garrafas de vinhos em excelente estado de conservação são devolvidas aos garçons por "certamente estarem avinagradas".

1. Bons produtores, bons importadores e bons restaurantes MUITO raramente permitem que um vinho que possa estar "avinagrado" chegue até mesa.
Para que o vinho se torne GRADUALMENTE vinagre, é necessário que ele entre em contato com a bactéria que realiza a fermentação acética E, vejam bem, E haja contato com o oxigênio. Ou seja: garrafa limpa, uvas saudáveis e rolhas de mínima qualidade não geram vinhos avinagrados assim, à toa.

2. Reconhecer um vinho bouchonée requer treino. Algumas vezes, não se percebe no nariz, mas sim na boca. Outras vezes, aromas desagradáveis de redução (fenômeno físico-químico que acontece na ausência de oxigênio) ou por um excesso de conservantes utilizado pelo produtor se apresentam no início mas logo desaparecem, confundindo o desavisado.

3. (e mais importante do que todo o resto)

Não gostar do vinho não implica em poder devolvê-lo. Se foi uma indicação do sommelier ou garçon, faça-o saber de quais características no vinho você não gosta e pense duas vezes antes de aceitar nova sugestão, mas não obrigue os outros a arcar com seu próprio gosto.

Lição Quatro: Ainda nao entendi o que é boxonê, mas vinho com rolha de prástico eu não tomo.
ou
Nem tudo que reluz é ouro, nem tudo que protege é cortiça.

A rolha ainda é, sim, o melhor dos vedantes para as garrafas. Porém, é também um produto natural, escasso, de alto custo de produção (um sobreiro leva 40 anos para produzir a primeira casca de boa qualidade e depois produz somente mais 4 "safras", uma a cada dez anos) e sujeito a contaminações que podem afetar o vinho.

Bouchonée é, portanto, o vinho que foi afetado pela rolha ou, mais precisamente, por uma substância produzida por um microorganismo, chamada TCA, ou tri-cloro-anisol. As rolhas sintéticas, assim como as tampas de rosca e outras formas de vedação menos conhecidas, foram criadas para procurar emular as propriedades da rolha diminuindo o custo e anulando o risco de contaminação.

Embora ainda se saiba bem pouco sobre alguns aspectos dos novos vedantes, há experiências bem-sucedidas com todos eles, inclusive com relatos (muitos) de vinhos submetidos a guarda de 30 anos com tampas de rosca.

Donde concluo eu que, se o vinho está bom, não interessa como foi fechado...


Para ler a terceira parte, clique aqui.

terça-feira, 20 de março de 2007

De Frescuribus non Proliferandus Est (ou Deveriabus Ser) - Ou "Larga de Frescura com a Minha Garrafa de Vinho!"


Acabo de descobrir mais uma fonte, dentre as muitas do momento "blog de vinhos", de boas referências online sobre vinho: o site "Bacco e Bocca", que vocês podem encontrar na seção "Outros Perípeces" ao lado.


Bacco e Bocca é uma "dupla de cinco" amantes do vinho, alguns deles aparentemente profissionais do vinho, mas inimigos da baboseira enológica (e restauratológica) que se espalha com agilidade pelo território nacional e um dos artigos mais ácidos e inteligentes deles é sobre a "frescura no serviço e consumo de vinho no Brasil", o que é muito visto e pouco debatido por aí.

Já há algum tempo venho realizando pequenos treinamentos com equipes de serviço em restaurantes e, ao contrário do que os proprietários (e da própria brigada) esperam, antes de conseguir falar qualquer coisa sobre os vinhos da carta não consigo evitar abordar alguns assuntos mais, hmmm, imediatos com eles, tais como a importância de conhecer o produto que está sendo vendido, antecipar-se ao cliente observando-o e de fato interpretando-o para decidir como agir durante o serviço e etc.

É por aí que chegamos ao ponto que Iacovos, colaborador do Bacco e Bocca, explorou com tanta, vamos dizer, pungência: a série de frescuras, tradições e expectativas que o brasileiro absorveu e/ou gerou sem pensar sobre o assunto. Seguem algumas delas, as que normalmente aparecem rapidamente nas reuniões com as brigadas:
  • A Rolha: cheirar ou não cheirar, eis a questão;
  • A Prova: decidindo se o vinho está bom;
  • A taça: a grande é pra água e vinho branco, a pequena, para vinho tinto. Não, é o contrário. Não, a maior para água, a segunda para tintos e a terceira para rosé. Não, é o contrário.
  • Quem escolhe o vinho? O homem ou a mulher?
  • A temperatura ambiente: essa amiga do tinto.
  • A adega: garrafa deitada ou morte!

Durante minha nada longa experiência de pesquisa sobre vinho, pude encontrar uma e outra curiosidade sobre a origem de alguns "mitos do vinho" e também um ou outro autor que decidiu levar adiante com inteligência algumas perguntas que haviam ficado grudadas no coador da tradição e vou passar para vocês as minhas impressões até o momento.

Lição Um: O Tahiti não é aqui.

Ou a Europa, pra ser mais exato. Portanto, a temperatura ambiente (que não é a temperatura de serviço dos vinhos nem lá) do Brasil não é exatamente a que encontramos nas adegas subterrâneas de Paris. Esse negócio de que "vinho branco é servido gelado e vinho tinto à temperatura ambiente" NÃO EXISTE.

Assim como com quase todos os outros aspectos do mundo do vinho, não há lei, mas sim linhas gerais de orientação, para que as pessoas não se percam.

Vinhos brancos podem ser servidos bem gelados (7°-8° no caso de alguns espumantes) ou gelados (10°-12°, no caso de brancos frescos e leves) ou, até mesmo, suavemente gelados (14°-15°, para brancos mais complexos que tenham mais o que mostrar aromaticamente).
Os tintos normalmente ficam desagradáveis abaixo dos 15° (lembrando que o frio diminui a intensidade de aromas de QUALQUER COISA e também anestesia nossos receptores sensitivos), mas também mostram-se muito tânicos e desequilibrados acima dos 20°.

Lição Dois: Mamãe já dizia: em Roma como os Romanos!

Há alguns milênios atrás, num dia primaveril, um patrício romano, que tinha em sua adega algumas ânforas de vinho, teve a memorável idéia de servir para seus convidados um pouco daquela reserva pessoal de tão delicioso néctar.

Mandou descer um dos escravos e trazer uma das ânforas, lacrada, é evidente, como deveria ser: algum tipo de tampa rústica que merecia a maldição de todos os Deuses Familiares da casa, pois evitava que seu vinho se derramasse ou que alguma sujeira se depositasse ali dentro, mas não o protegia de alguma coisa (o ar, talvez, ou quem sabe alguma praga rogada por um vizinho) que o transformava, com o passar do tempo, em algo desagradável e ácido.

Um de seus amigos, bastante viajado e culto, havia aprendido com algum mercador fenício um truque: se um ou dois goles de azeite (melhor se abençoadamente comprado do templo) fosse derramado dentro da ânfora, magicamente o vinho não se estragaria tão rápido.

O patrício, como bom anfitrião, a cada vez que deveria servir um de seus fantásticos e bem-conservados vinhos, fazia questão de, num só gole, deglutir todo aquele azeite, que certamente não tinha a mesma textura nem o mesmo sabor do vinho.

E é assim que, até hoje, todos os bons anfitriões fazem questão de deglutir o primeiro golinho de cada garrafa, para se certificar de que seus convidados não estão ingerindo nem uma gota de líquido estranho e viscoso, o que nos leva à próxima parte...

Para ler a segunda parte, clique aqui.
Para ler o artigo dos Bacco e dos Bocca, clique aqui.

segunda-feira, 12 de março de 2007

De Gustibus Non Disputandum Est 2

Se você não leu a primeira parte, clique aqui.

Muito bem, vamos retomar o Gosto.

É fácil observar toda a polêmica dos infinitos debates sobre a tecnologia de produção, sobre as opções que o enólogo tem. Qualquer apreciador com um pouquinho mais de tempo de taça já se embrenhou em uma conversa:

· sobre inner-staves ou oak chips (tábuas facilmente manobráveis dentro dos tanques de aço ou lascas de madeira que, de certa forma, substituem as barricas de carvalho ao doar ao vinho aromas e sabores característicos);
· sobre screw-caps (as famigeradas tampas de rosca, que a maioria simplesmente não considera ao falar de vinho, mas nem percebe nas garrafas de whisky e de várias outras das bebidas mais renomadas e, às vezes, mais caras do mundo);
· sobre chaptalização, desalcoolização, parkerização, michel-rollanderização ou qualquer outra das tendências do mercado enológico atual.


Com o dedo na ferida: tem gente esquecendo de que é o GOSTO das pessoas que molda o PRODUTO no mercado e o gosto das pessoas hoje é bem claro: as pessoas querem sabores que se apresentem de imediato; querem vinhos prontos para beber; querem maciez e dulçor; e TODO MUNDO quer novidade o tempo todo.


Como faz notar Eric Asimov, colunista de vinhos do New York Times, a imensa maioria dos vinhos vendidos no mundo é elaborada industrialmente. “Eles são commodities e os produtores têm todas as justificativas do mundo em utilizar a tecnologia que esteja à disposição para criar um produto que venda”, defende Asimov.


De fato, não é de se julgar a Fiat por fabricar Uno Mille, só porque a Rolls Royce e a Land Rover fazem carros dignos da realeza britânica. O Uno, como os vinhos que obtiveram suas características organolépticas através de métodos mais baratos e rápidos de produção, tem um objetivo e um público específicos, enquanto os Rolls Royce e os Grands Crus franceses têm os seus próprios objetivos e um público extremamente restrito.


Um dos exemplos mais eloqüentes da acirrada “Disputa do Gosto” é o uso da madeira de carvalho na produção vinícola. Desde tempos imemoriais, a madeira vem acompanhando o vinho: inicialmente, era somente um veículo, um recipiente para estocagem, dado que, nas condições ideais, era um material estanque, de boa manobrabilidade e fácil de trabalhar e dar forma.


Com o passar dos anos, produtores perceberam que, de acordo com as características da madeira utilizada (a espécie da qual provinha, o tamanho do recipiente, o quão nova ou velha é a madeira, etc.) o vinho recebia esta ou aquela influência.


Com a entrada de fato dos americanos no mercado mundial de vinho, a madeira adquiriu um papel central e de relevância como nunca antes. O uso de barricas pequenas de carvalho novo, com tostado forte (ou pelo menos médio), garantia que a passagem do vinho pela madeira não passasse despercebida, pois seus reflexos no vinho tinham caído no gosto do público.


Madeira no vinho é, como tudo em enologia, uma questão de opção e de gosto, não necessariamente de qualidade. Pessoalmente, os vinhos excessivamente amadeirados, como os excessivamente frutados (e os excessivamente alcoólicos, os excessivamente ácidos, os excessivamente no geral), não são os que mais me agradam, embora sejam, muitas e muitas vezes, excelentes companheiros de taça.


Para ler a opinião de Asimov sobre a tecnologia no mundo do vinho, clique aqui.
Para ler outras peripécias, clique aqui.


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